“A imaginação é a memória que enlouqueceu”
Mario Quintana
1950, (...)
Cena 1
chega trôpego
[ as portas de vidro e arabesco acobreado do hotel
escada de mármore branco
papel de parede em motivos barrocos verde água e sépia ]
[ som dos passos ]
sobe
cai na cama
[ o quarto cinza esbranquiçado
a natureza morta no quadro sobre a cama
a mesa de mogno gasta, crua de adereços
as cortinas ásperas, creme
o piso de lajotas sanguíneas desgastadas ]
espirala
cessa tudo;
é breu dentro do olho
Cena 2
entra a moça
[ 17 anos, o papel vergê A3 e prancheta
exausta de todo o dia coletando face alheia
nalgum boulevard – qual?
as ancas ainda poucas, estreitas.
o rosto frágil
os ossos dos cotovelos e joelhos
claros, nítidos, pontiagudos
pontuando a carne ]
o estranho na cama de lençóis
de linho? de algodão ?
[ voz em off ]
– era minha a cama, e o estranho...
[ na cama alugada do quarto impessoal
o lençol branco, o quarto exatamente igual
aos da coluna correspondente no edifício ]
Cena 3
[ voz em off ]
– que se tem a perder?
cena muda, de corpos e atos;
[ ela sóbria, suscetível, só
o noivo que a espera na Suécia
oficial da marinha cuja beleza
de maxilar proeminente impõem austeridade
uma família de relativa liberalidade
ela estrangeira estudando arte
veio ao mundo num 29 de fevereiro
aniversaria de quatro em quatro anos. ]
Ela – abre a porta
e fecha, um gesto rotineiro
Ela – o corpo se move como dum gato
eriçando pêlos e membros
mescla de raiva, adrenalina, curiosidade
Ele – se move na cama
gira o corpo
ressona
ronca um pouco
Ela – reclina o corpo
encosta no homem
semi defunto exalando álcool
Ele – faz que acorda
cerra os olhos
quase abre
Ela – o compele
sacode o corpo pelos ombros
certa delicadeza na revolta
Ele – acorda
um sobressalto e tonteia
estabaca na cama
Ela – abre a porta
indica a saída
Ele – senta-se na cama
calça sem pressa os sapatos
Ela – abranda
afrouxa os ombros
reconsidera;
não corre mais risco
Ele – olha a moça
nos olhos de ressaca
indo à mormaço
apaziguando
tornando gris
Ela – observa
acomete certo instinto maternal;
os gestos moles do bêbado
latino, bigodes espessos, estatura mediana
Ela – fecha a porta.
de quem é esse texto/roteiro???
ResponderExcluirTJ
desse site, chama folhasemdata.
ResponderExcluirparece que gostou, que bom!
se tiver alguma intenção é só falar
mas a proposta da gente é fundir duas
numa persona então... o autor é nós.
se não, tomo por elogio
a exclamação, e tá valendo
um sorriso aberto
té!